terça-feira, 15 de novembro de 2011

A RESPEITO DOS LUGARES

         Faz algum tempo venho me perguntando se esse papo de "educação e espiritualidade" seria ou não mais uma teorização ou modismo tão ao gosto dos, AINDA, hegemônicos setores da Academia.
Então, cabe sempre a pergunta: como é que estes postulados, estas palavras bonitas, podem ser traduzidas no dia a dia de nossas vidas ad intra e ad extra muros escolares?

          Acontecimentos recentes, ocorridos na Faculdade de Educação da UFF, evidenciam uma grande confusão quanto a ocupação dos lugares. Com a tão necessária democratização das relações e do próprio espaço escolar é evidente que a "novidade" tem ainda hoje provoado insegurança em muitos. É como se  desprovidas da escora autoritária algumas pessoas não soubessem como se relacionar para além da rigidez hierárquica. Então temos estudantes que não sabem guardar o saudável e necessário distanciamento entre si e seus professores. Por outro lado, temos professores que em nome da "horizontalização das relações" (uma grande mentira) aceitam passivamente serem desrespeitados por seus alunos. Evidentemente há casos de professores que além de não se darem  o respeito, não respeitam seus alunos e o resultado, quase automático disso, é serem desrespeitados por aqueles que eles desrespeitam. A conivência de "educadores" com estudantes arrogantes, mal educados e autoritários tem produzido um dos cenários mais tristes em espaços que deveriam ser eminentemente educativos. Com medo de serem taxados de autocráticos, muitos educadores calam-se diante dos desmandos e abusos perpetrados por estudantes. Crendo-se todo-poderosos, estudantes mandam e desmandam, fazendo exigências algumas vezes as mais estapafúrdias.

         Uma boa reflexão a respeito dos lugares se faz hoje urgente não apenas na escola. Também nas famílias presenciamos casos semelhantes, onde pais não assumem suas responsabilidades, sendo a maior delas a de dar educação a seus filhos. Mas, a gente só pode dar aquilo que tem. O que vemos? Pais e mães coleguinhas que saem para "a noite" com seus filhos, para  consumir bebidas alcoólicas e "paquerar" (como noticiou a imprensa em algumas ocasiões). Filhos que gritam e ofendem seus pais. Não estou defendendo o retorno  (impossível) ao patriarcalismo dos engenhos canavieiros, a "obediência cega", ou a subserviência. Estou advogando saídas inteligentes para os problemas que temos a enfrentar. Então a escola muitas vezes herda aquilo que deve ser uma das funções da família; a educação básica, o ensino do respeito por todas as pessoas.
  
         Essa doença do desrespeito está mais ou menos presente em toda a parte. Ela evidencia uma das ignorâncias básicas da grande maioria dos seres humanos na contemporaneidade:  o desconhecimento da existência de uma Ordem ou Lei  Universal  a nos governar. No Universo tudo, em sua origem, atende a necessidades específicas, e como tal cada coisa, cada ser humano possui um lugar a ser ocupado. São lugares espirituais (que  podem até se traduzir em materialidades, mas não tem nada a ver com as hierarquias humanamente estabelecidas, cuja intenção na maior das vezes é o exercício do conhecido par domínio-submissão). Isso diz respeito à História de cada um de nós. O importante é bem ocupar os lugares que nos cabem. Estes lugares são primeiramente SERVIÇOS  a serem exercidos em benefício dos que deles necessitam. Por que é tão importante sabermos disso?  Dentre outras coisas porque assim não corremos o risco (egóico) de nos identificarmos com os lugares que ocupamos. Assim: o sacerdote ou sacerdotisa de uma tradição religiosa, seja ela qual for, desconhecendo esta Realidade dos lugares, poderá crer-se "O sacerdote", o "proprietário do sagrado",  "guardião da moral", "policial do dogma"... e como tal, desprezar  e pretender se impor a seus "inferiores", manipulando este poder em benefício próprio. Quem de nós não sabe a que estou me referindo?  Os governantes egoicamente identificados com o lugar tornam-se autoritários usurpadores de um poder que não lhes pertence. O mesmo risco podemos correr nós, os educadores: ao nos acharmos "Os educadores" podemos incorrer no grave equívoco de nos julgarmos os sábios, proprietários do conhecimento, "donos da verdade". Mesmo as mães, os pais, ao não se darem conta de que estão ocupando estes importantes lugares podem tanto não assumir os compromissos oriundos deste lugar que  deveriam estar efetivamente ocupando quanto (tão nefasto quanto este) acreditarem-se "As mães", "Os pais", infalíveis, senhores da vida dos filhos, os  "sempre certos". O importante livro do educador e psicoterapeuta junguiano Carlos Amadeu Byinghton (A construção amorosa do saber) nos dá importantes dicas a respeito da assumência dos arquétipos presentes na ação do educador.

         Agora podemos retomar a questão apresentada no início: educação e espiritualidade, mais uma conversa fiada? Esta questão dos lugares ocupa lugar de destaque, nem sempre tão explícito, é verdade, tanto nas tradições espirituais quanto nas vertentes pedagógicas dignas deste nome. É por isso que se pode falar em Educação Inciática (Gusdorf), Psicologia Iniciática (Graf Durckheim). Arrisco dizer que tanto a Educação quanto a Religião têm como uma de suas principais tarefas propor reflexões, fornecer orientações e prestar acompanhamento a seus discípulos no que diz respeito ao conhecimento e ocupação dos lugares que se apresentam no Universo. Não nos pertencendo, os lugares são responsabilidades a nós confiadas, devemos deles zelar com responsabilidade e dedicação.

         Falemos agora um pouco a respeito deste belo lugar que ocupamos: o planeta Terra, a Mãe Terra, Pachamama generosamente a nos acolher e nutrir em nossas passagens por aqui. O desconhecimento desta realidade ( o lugar não nos pertence, foi a nós confiado) tem gerado atitudes irresponsáveis e mercantis cuja tônica é a devastação. Uma educação de motivação espiritual fornece meios para que  esta compreensão nos seja possível.

         Nos espaços consagrados à educação, o respeito é  condição essencial ao exercício das responsabilidades de cada um e de todos. Em se tratando de espaços públicos as possibilidades são indubitavelmente maiores, mas as responsabilidades também. Afinal, a quem muito foi dado....

Carlos Parada


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sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Educar: Educar-se

         A cada dia que passa fico mais convencido de que um dos maiores entraves à realização de práticas educativas dignas deste nome são primeiramente os próprios educadores. Não se assustem, não estou fazendo coro com a grande maioria dos mandatários dos poderes públicos que, irresponsavelmente, além do descaso com a educação escolar culpabilizam os professores pelos fracassos da educação. Nem tão pouco com uma perspectiva mercantilista da educação escolar, segundo a qual a mera realização de cursos,  treinamentos e melhores salários por si resolveriam os graves problemas da educação e garantiriam uma "educação de qualidade". Em primeiro lugar é bom deixar bem claro o que queremos dizer quando falamos em "educação de qualidade". Numa perspectiva espiritual, práticas pedagógicas de qualidade são aquelas que servem de instrumento de humanização tanto dos educandos quanto dos educadores. É uma educação fundamentada em valores humanitários. Uma educação libertadora da tirania do ego. Em suma: uma educação que capacita para a construção de relacionamentos respeitosos, fraternos, responsáveis.
         Alguns pensam que esta modalidade de educação desconhece a necessária formação técnica capaz de capacitar profissionais para o mercado de trabalho. Mas não se trata disso, muito pelo contrário. Uma educação de motivação espiritual ao reconhecer a primazia das pessoas sobre as coisas, e da saudável predominância do ser sobre o ter (o ter servindo ao ser), formará profissionais capazes de  realizações duradouras, promotoras da paz, geradoras de verdadeiro progresso. O progresso técnico em sintonia com o progresso humano. 
         Mas voltando ao início. Por que disse anteriormente que os educadores são um dos maiores entraves à realização de verdadeiras práticas educativas? Simplesmente porque, em se tratando de práticas educativas, o dizer e o fazer não podem estar de maneira alguma dissociados. O educador só é verdadeiramente educador quando suas práticas (todas elas, dentro e fora da sala de aula) estão em sintonia com suas teorias, suas crenças, seus escritos, seus discursos. E isso vale para todos os seres humanos. Afinal, seja qual for nossa ação ela é sempre exemplar: um mau ou bom modelo a ser imitado por outros. O que temos visto, em geral, são professores  que se contentam em serem meros transmissores de conteúdos, na maior parte das vezes absolutamente inúteis e ultrapassados. Mas quem de nós, não querendo se deixar iludir, pode afirmar que todas as suas práticas cotidianas estão em perfeita sintonia e coerência com seus discursos, escritos, e crenças? É por isso que o educador  é, necessariamente, um ser em permanente construção. Quem teve a oportunidade de conhecer mais de perto o querido professor Paulo Freire sabe do que estou falando. As crises e "fracassos educacionais" são a grande oportunidade para que nós educadores assumamos a nossa Missão no mundo: pessoas que se dedicam à construção de humanidades, começando por si próprios.
         É por tais motivos que necessitamos uns dos outros. Práticas educativas, dignas deste nome, estão necessariamente revestidas de sacralidade, uma vez que  dialógicas por excelência. É disso que Gusdorf está falando quanto se remete a uma "educação inciática" (Professores para quê? Por uma pedagogia da pedagogia). O outro não é esta suposta ameaça a nos espreitar. Não é o concorrente com o qual travaremos batalhas por " um lugar ao sol". Isto é mais uma das ciladas do ego, visto que o que é nosso é nosso: colhemos o que plantamos, recebemos o que estamos necesitando para nos tornarmos mais humanos. O Outro é este Mistério que nos revela a nós mesmos. Mas, o "homem apequenado" (Milton Santos: Por uma outra globalização, do pensamento único à consciência universal), ainda não pode enxergar isso posto que o ego (deseducado, medroso, arrogante, iludido) só vê si próprio, caricatura do Ser. É por isso que a solução para os problemas da educação passa necessariamente pela conversão (da etimologia: revolução, mudança) do educador e -em consequência disso- dos métodos por ele adotados. Só unidos, em prol da humanidade, em defesa de nós mesmos e de nossa verdadeira natureza (natureza amorosa, comunitária) poderemos realizar este movimento que é, primeiramente, um movimento de si em direção a si mesmo (à essência e não ao individualismo egóico, elevado (?)  à categoria de dogma pelo nihilismo materialista, historicizado nas práticas capitalistas). Então, esta revolução se inicia no interior de cada um de nós e se faz cultura, modus vivendi, a partir de nossas relações mais corriqueiras e diárias conosco mesmos (com nossa consciência, nosso corpo, nossa alimentação, nossos sentimentos, nossos pensamentos, nossas escolhas de todo momento, nossas coisas), com nossos parceiros de jornada (O Outro), com a Mãe Natureza (expressão da Divindade em nós). É assim que nos capacitamos para realizações construtivas, para a promoção de felicidade, de projetos coletivos e humanitários de mundo, de sociedade. É a este jeito de vivenciar e promover, metodológica e sistematicamente, este modo de ver a si mesmo e ao movimento da vida que chamamos Educação Espiritualizada.

Carlos Parada
        

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

E NASCE O NEPES

            É com grande alegria que anunciamos a criação do NEPES (Núcleo de Estudos, Pesquisas E Extensão em Educação, Espiritualidade e Sociedade) da Faculdade de Educação da UFF.
            Inicialmente somos quatro, os docentes vinculados ao Núcleo. Fiéis ao caráter transdisciplinar de  uma Educação Espiritualizada, uma educação dedicada à Humanização, os profissionais vinculados ao Núcleo são originários das Áreas de Filosofia, História, Pedagogia e Psicologia. Em breve, certamente mais profissionais e estudantes, das mais diversas áreas do conhecimento, estarão compondo este que pretende ser mais um Serviço prestado à causa de uma Educação comprometida com a transformação das estruturas internas (humanização) dos atores da Educação. Do nosso ponto de vista este é o único caminho possível de transformação das   estruturas iníquas ainda predominantes em nossa sociedade. A prática do autoconhecimento, através da qual nos é possível a nossa transformação em pessoas melhores. Trabalho este que exige dedicação, constância e perseverança. Unidos a peleja pode ser mais fácil, mas o Caminho é o Caminho de cada Um. Este movimento de olharmos para dentro de nós, ao contrário do que se possa pensar, não é o atalho do isolamento, do individualismo. É o Caminho do Encontro, onde nos conhecendo mais, onde educando nosso ego, colocando-o a serviço do Eu verdadeiro, Eu Interior, Essência (Self junguiano), nos capacitamos para relacionamentos mais verdadeiros, mais profundos, mais fraternos.
               O NEPES, por enquanto, reune-se às terças-feiras às 9 horas na sala 418 da Faculdade de Educação da UFF. Você pode entrar em contato com a gente através do e-mail espiritualidadeeeducacao@gmail.com.br ou pelos telefones (21)  2629 2688 0u 9482 2435.